Omagio a Eikoh Hosoe, de Cicchine

terça-feira, 11 de setembro de 2007

Devaneios de um futuro

Ela remoia cada palavra e cada pensamento por tanto tempo que relógio nenhum contara mais, nem mesmo os relógios de céu que a tudo contam, sem aquela necessidade da exatidão terrena.

Havia tantas coisas em sua cabeça que acabaram por atordoá-la de um jeito bobo e esfumaçado como era o dia que mal se via lá fora. Dia este, que iludia e cansava os olhos de seus observadores mais desatentos.

Tinha medo de tanto pensar, acabar explodindo a um estalar de dedos.

E assim, depois da explosão premeditada, seu corpo todo estilhaçado pelo chão e o coração seria o único a permanecer inteiro, duro como um diamante, que já nada mais valeria. Não porque este sempre foi duro, mas porque as desilusões mundanas o endureceram e transformaram, como transforma-se carvão em diamante.

Isso de ler “Dom Casmurro” acabara por “casmurrar-lhe” a vida, os olhos e os sentidos.

Aquele menino lá de longe ganhara uma boa proporção em seus descompassados pensamentos. Tinha idéias que eram sem pernas e sem asas para chegarem lá longe. E ela, mal sabia onde era lá longe, nem as horas ela sabia e isso não lhe despertava nenhum interesse.

Árvores, serras, mato seco, terra vermelha e linhas naquele asfalto, velho conhecido.Mas ela, meio que acordada, sonhava com luvas, cheiros, idas e vindas, que não eram estas e talvez nem estivessem nos planos divinos para aquela sua vida medíocre.

Dias antes, ela havia bisbilhotado o futuro, mas o responsável celeste pelos planos pra ela, sabe que ela foi quase vitima no jogo de exorcizar o passado e descobrir o futuro. Mas quem seria acusado ou absolvido disso? Isso lá era pecado? Ela não sabia, e caso fosse não era preocupação para agora.

Era curiosa e só saber como soube do futuro não lhe contentara por completo. Queria ter certeza de que uma pessoa participaria, e ainda exigia que este fosse ator principal e não uma mera figuração na peça em que ela fora convidada a ensaiar. Que pilhéria, ensaiar a peça na qual era atriz e diretora. Mas valeu-se da dica e prometeu com olhos baixos e sorriso amedrontado ensaiar, fugir de quem outrora amava e temer o futuro que brilhava nas pedrinhas em moedas em sua frente.

Estas tinham um poder de cair na mesma e exata posição respondendo quantas vezes se quisesse a mesma pergunta. Ela tentou entender, procurou alguma explicação física, simulou que nada mais era que um simples truque de magia ilusória barato, porém não encontrando respostas nem cá nem acolá, limitou-se em acreditar, deixando este assunto naquele lugarzinho de coisas inexplicáveis, ou até mesmo de fenômenos sobrenaturais.

O que era sobrenatural, quando este nada mais era do que uma denominação dada por nós, meros mortais, para tudo aquilo que era desconhecido em livros e fórmulas?

O bem e o mal regiam a fórmula básica do sobrenatural e isto, sabia ela, era uma filosofia no melhor estilo boteco. Eles confundiam-se e deles é que vinha a vida, já tão simples e a morte, com toda sua complexidade e maldições tolas.

Quantos devaneios passavam naquela cabeça, tantos que não me recorda o inicio e o porque deste escrito. Tão pouco este foi começado visando ter um fim. Acabará como os outros, representando um fragmento de dia, sem merecer ou exigir uma compreensão maior de seus possíveis leitores.

E saber que este começou querendo apenas ser a descrição de um dia bonito, para que os leitores futuros (daquele futuro longe) possam conhecer um dia bonito disso que já será passado e não mais existirá. Mas como hoje não há dia cuja beleza mereça ser narrada em linhas, ela continuou ali, com vontade de um dia ser história e matutando o futuro que a vidente lhe mostrou.

Danieli Buzzacaro
10/09/2007